domingo, 27 de abril de 2008

Não!

- Não, eu não quero mais!
- Ora! Por quê isso agora? Você nunca foi assim!
- É, eu nunca fui mesmo... mas agora eu sou!





Era estranho quando pensava em quantos anos da sua vida perdeu sem ter coragem de dizer NÃO.

Aquela festa chata que teve que ir pois não teve coragem de dizer um não a sua amiga. Aquelas reuniões familiares em que ela apenas sorria e concordava com tudo quando na verdade gostaria de agir completamente diferente. Até aquela comida ruim que não teve coragem de dispensar quando sua mãe lhe trouxe com carinho.

Ela não precisava ser grossa, só precisava ser sincera e dizer "Mãezinha, me perdoa, mas NÃO estou com vontade de comer isso." Mas cadê a coragem?

Tantas coisas que ela queria ter vivido mas simplesmente nem tentava por medo do julgamento dos outros.

Tentou entender o porquê de ter agido assim durante tanto tempo. Daí lembrou de quando sua mãe lhe ensinou que sempre deveria perdoar e assim ela vinha fazendo. Talvez por isso preferisse ser maltratada do que maltratar alguém, pois ela sabia os limites do seu perdão, mas não sabia os limites das outras pessoas. Só que isso não estava certo! Ela não precisava maltratar ninguém, mas nem por isso tinha que ser maltratada! E o amor próprio ficava aonde? Muito bem escondido como ela sempre fez questão de deixar? NÃO! Agora ela sabia dizer essa pequena palavra! E sabia o poder de libertação que ela podia lhe proporcionar.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

A chuva!


Naquela manhã a chuva mostrou todo o seu poder.
Relâmpagos e trovões tentavam, em vão, assustá-la. Sempre que surgia uma imensa claridade seguida de um estrondo pavoroso ela simplesmente sorria.
Quando pequena aprendeu a gostar de ouvir a chuva e todos aqueles sons que a acompanhava. Muito tempo sem esses sons não era um bom sinal... Já dizia a sua mãe!
Apesar de o tempo ser ótimo para ficar em casa, bem agasalhada, lendo ou simplesmente admirando aqueles sons, ela preferiu fazer exatamente o contrário. Queria sentir o outro lado da vida já que nunca tinha se permitido. Em dias chuvosos só saia quando era realmente necessário. Dessa vez seria diferente! Buscou um guarda-chuva, vestiu uma roupa leve, porém escura, deixou os cabelos soltos e apenas com as chaves ao bolso, saiu de casa.
Para quê o guarda-chuva? Lembrou-se do ditado "se estava na chuva era para se molhar"! Ainda não estava tão distante de casa. Voltou e o jogou na varanda.
Preferiu sair assim, com os pingos lhe molhando a face e todo o corpo. Saiu feliz, saltitando e cantando diversas canções do seu agrado. Deu várias voltas em torno de um lindo parque que havia próximo a sua casa. O cheiro da chuva ali, que era cercado por lindas árvores, não se comparava ao cheiro que ela sentia de dentro de casa! Brincou um pouco no balanço como fazia há tantos anos quando ia aos parques da sua antiga cidade. Mas geralmente eles costumavam estar cheios de crianças e ali ela estava sozinha.
Ninguém diria que era ela. Logo ela! Que até então se mostrava tão fraca, tão medrosa e tão controladora das suas próprias vontades.
Ela ficou feliz por se ver assim... Livre!
Foi uma decisão difícil. Não é da noite para o dia que nos libertamos de todas as nossas amarras. Mas a escolha havia sido feita e esse era o primeiro passo.

domingo, 20 de abril de 2008

Nostalgia

Os corredores estavam desertos. Ela lembrou das diversas histórias mal-assombradas que ouvira e até contava sobre aquele colégio tão antigo... As passagens secretas, que realmente existiam, e a sala onde as freiras colecionavam caixões, que nunca ficou provado, pois nunca ninguém teve coragem de ir constatar. Lembrou das brincadeiras, dos sustos, das repreensões quando tentava entrar em algum lugar que era proibido para os alunos. O que será que tinha lá? Como ela gostaria de saber! Mas a sua única certeza era de que nunca conseguiria entrar por aqueles becos e portas gigantescas. Percorreu o corredor central até o seu final, onde tinha a antiga biblioteca. Ela ainda continuava ali e ainda continuava antiga. Rara as vezes que encontrava um livro do seu agrado, pois todo aquele espaço era cercado por exemplares antigos, alguns que ela seria capaz de apostar como nenhum aluno jamais havia ao menos folheado. Conseguiu ouvir a voz da bibliotecária, sempre com a cara "amarrada", dando sermão em qualquer um que se atrevesse encostar sobre a sua bancada.
Ela entrou e passou a vista sobre todos aqueles livros. Buscou um. Um que ela havia lido a tantos anos mas que lembrava como se tivesse o acabado de ler a poucos instantes.
Logo já estava na escadaria que dava acesso a linda capela. Era lá que passava a maior parte dos intervalos entre as aulas. Foi lá que ela começou a ler o livro novamente.
Era exatamente 6h da manhã, o despertador tocava insistentemente. Ela o desligou, mas permaneceu deitada por alguns, poucos, minutos. Tempo suficiente para que pudesse recordar de uma época tão especial em sua vida. Logo levantou, pois a vida que a esperava não lhe dava espaço para momentos nostálgicos. Sentiu falta daqueles momentos, apesar de sua vida atualmente ser intensa, satisfatória e confortável... Mas não havia mais freiras, contos proibidos e passagens secretas...

sábado, 12 de abril de 2008

Feridas...


Vez por outra a vida nos prega umas surpresas. E nem sempre boas...E com ela isso estava se tornando cada vez mais constante. Já não aguentava mais viver com uma angústia que já tomava parte do seu corpo, todos os dias. Quando acordava, ela já estava ali dentro e mesmo ao dormir ela continuava se fazendo presente.O que achava mais impressionante era a capacidade de algumas pessoas viver tranquilamente, sem peso algum na consciência, mesmo sabendo quanto sofrimento causa ou já causou em vidas alheias.Será se era esse peso que ela estava sentindo? Será se ela foi capaz de ferir os sentimentos de um outro alguém? Não! Ela até poderia ferir alguém sem ao menos saber, mas nunca proposital e nunca se vangloriaria disso. Mas existem pessoas cruéis, que ferem e mesmo assim se comportam como se não devessem nem ao menos um pedido de desculpas... talvez sua dor fosse por ela ter sido a pessoa ferida. Isso sim ela tinha certeza de que havia acontecido. Ela se esforçara tanto para não ferir, só que não tinha como evitar ser ferida.Ser racional, por mais difícil que isso possa ser, é a solução mais adequada para reduzir a dor. Mas como ser racional? Como agir? Ela não tinha muitas certezas. Recorreu ao tempo, a Deus, a Bíblia, aos amigos e a força que sempre esteve ali, dentro dela. A força que muitas vezes fez questão de mascara-la ou não dar a importância devida, fingindo que ela não existia. Mas ela existia e cumpriu direitinho o seu papel!

"Fácil é demonstrar raiva e impaciência quando algo o deixa irritado. Difícil é expressar o seu amor a alguém que realmente te conhece, te respeita e te entende... é assim que perdemos pessoas especiais."(Carlos Drummond de Andrade)